Fãs e admiradores do malogrado rapper moçambicano Azagaia, ou simplesmente Mano Azagaia, apelam por uma estátua em homenagem aos feitos do rapper pela cultura moçambicana e o movimento Hip Hop lusófono.
Foi feito uma imagem ilustrativa desta mesma estátua onde recebeu apelo vários moçambicanos e além fronteiras;
De lembrar que o rapper Azagaia sofria de crises epilépticas há anos. E teve várias quedas. Por isso mesmo, o rapper decidiu fazer um exame e ficou a saber que sofria de um tumor no cérebro. O preço para a operação na Índia era alto ou, pelo menos, o rapper não tinha o dinheiro que se exigia. Preço alto é relativo. Logo, familiares, amigos e admiradores juntaram-se a uma campanha de angariação de fundos por Azagaia. Em pouco tempo, o rapper consegui o valor necessário e a cirurgia foi um sucesso. Ainda assim, e mesmo estando a cumprir com a medicação clínica prescrita, continuou a ter ataques epilépticos, já que a medicação não cura, mas pode ajudar a controlar a doença.
O representante da família Da Luz, Jorge Rungo, no velório, falou de tudo isso e ainda acrescentou que Azagaia continuou a cair em locais diversos, incluindo nos estúdios, a gravar. Então, quando a crise chegou, na passada quinta-feira, o corpo de Azagaia não resistiu e, sem sequer contemplar a sua esposa e as suas princesinhas pela última vez, partiu, deixando para trás uma sociedade em choque e admirada.
Azagaia, em diferentes ocasiões, referiu-se à morte nas suas composições ou em entrevistas. Aos próximos e admiradores, inclusive, disse que, quando morresse, independentemente da causa, que os seus não chorassem, que fossem fortes e continuassem com a luta… Houve, de facto, essa tentativa de conter a dor e a angústia. Quando a urna saiu da morgue do Hospital Central de Maputo, a transmissão televisiva não conseguiu vislumbrar nenhum rosto definitivamente consternado. O cenário mudou logo à chega da viatura da agência funerária à Praça da Independência, espaço que condiz tanto com a luta do rapper pela liberdade. Ali, onde há 36 anos foi velado um dos seus ícones preferidos, Samora Machel, sim, as lágrimas mostraram aos homens e mulheres quem manda sempre que a dor chega.
A urna chegou à Praça da Independência por volta das 7 horas. Bastaram alguns passos até a urna ser colocada no lugar destinado ao velório. De forma ordeira, os cidadãos anónimos e figuras conhecidas foram, numa enorme fila, ao Paços do Município de Maputo. Ali viram um dos “reis” do Hip-Hop, que viveu na vertical, na horizontal.
A igreja também lá esteve. Dom Dinis Sengulane orientou a missa do corpo presente. E não foi por acaso, afinal, o Bispo Emérito da Diocese dos Libombos foi quem baptizou o menino Edson, que, esta terça-feira, não viu a luz do dia. Apagou-se uma luz na família Da Luz. Rigorosamente, o membro da família que, nos encontros familiares, sempre gostou de declamar ou de falar aquilo que os seus irmãos até tinha receio de dizer. Sempre foi corajoso, sempre venceu o medo, a vergonha. Foi assim em casa, foi assim na rua, foi assim na sala de aulas, foi assim nas entrevistas, foi assim a compor e a cantar, sobretudo a compor e cantar. Também por isso, enquanto decorria a missa do corpo presente, as multidões continuaram a chegar à Praça da Independência. O facto de a cerimónia estar a decorrer num meio de semana não atrapalhou em nada. Milhares de pessoas estiveram naquela praça a acompanhar a sessão fúnebre em telas gigantes. Inclusive, quando alguma intervenção no Paços do Município de Maputo assim o justificasse, lá reagiam com estrondo. Foi arrepiante! Pelo menos, durante o velório, o povo lá presente esteve no poder, desconstruindo aquela velha frase de John Lé Carré, em O fiel jardineiro: “Esta é uma terra de subentendidos. Falar claramente é uma coisa de pecadores”.
O povo não esteve nada subentendido. Claramente e incondicionalmente, cantou “Povo no poder” com os punhos no ar e não pecou. Quase ensurdecedor. Por isso, várias vezes, Hélder Leonel, o mestre-de-cerimónias que também se confunde com o Hip-Hop moçambicano, teve de pedir para as pessoas estarem mais quietas. Obedeceram, quando puderam, mas sempre se manifestaram num ambiente que, na verdade, ajudou a colorir a sessão. Aquilo pareceu mais um comício à moda antiga do que um velório: Full de gente, full de emoções, full de sentimentos e solidariedade. Com uma diferença: os viva, viva, foram substituídos por “Povo no poder”.
No exterior e no interior do Paços do Município de Maputo, Azagaia foi também recordado como um “homem bomba”, pelo amigo Nandele, em referência a um título da música do rapper; foi recordado como a voz dos oprimidos, pelos amigos Izlo H e Iveth; foi recordado como um artista que soube fiscalizar os políticos, por Adriano Nuvunga, representante da Sociedade Civil; foi recordado como um homem que contribuiu imenso pelas artes e cultura moçambicanas, pela Ministra da Cultura e Turismo. Foi mais ou menos a essa altura que entre o público ouviu-se algumas pessoas a perguntarem umas as outras se o Presidente iria ao Paços para intervir ou não. Interveio a Ministra em nome do Governo.